CONCEITO ESTRATÉGICO DO ESTADO NOVO – 1945-1965

(Artigo originalmente publicado no n.º 1 da Revista Portuguesa de História Militar)

Em 25-11-1947, na biblioteca da Assembleia Nacional, o Presidente do Conselho dirigia-se à Câmara para dar nota dessa sua ilusão sobre o mundo do pós-guerra. No que ao império colonial podia interessar, afirmava: Por feliz coincidência ou providencial disposição, os destinos de toda a África são solidários com a Europa do ocidente. Excepto no que respeita ao Egipto e à Abissínia (mas não à África do Sul, membro da Comunidade Britânica), a Inglaterra, a França, a Bélgica, a Itália, Portugal e a Espanha têm, através de regimes políticos ou económicos diversos, a direcção efectiva e a responsabilidade do trabalho, progresso e bem-estar do sentimento africano. Uma política concertada de defesa e de valorização económica porá ao dispor do Ocidente produtos e riquezas que aumentarão de maneira assombrosa as suas possibilidades de vida e a sua contribuição para o intercâmbio mundial. A África é a base suficiente para a política que se deseje fazer.

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1956/57 – CARTAS DE PARIS PARA SALAZAR

Com a guerra na Argélia a decorrer, Marcello Mathias, embaixador de Portugal em França, corresponde-se com Salazar e dá-lhe as suas impressões acerca do que julga ser a duvidosa capacidade dos franceses para conduzir eficazmente a resistência às acções dos independentistas. Um tema que nos transporta para situações que iriam repetir-se, em Portugal, poucos anos depois.

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1965 /1968 – ÚLTIMOS ANOS DE SALAZAR NO PODER

Em 1965 concluía-se o primeiro mandato de Américo Thomaz como Presidente da República. Depois do susto político causado pela campanha de Humberto Delgado, em 1958, a designação do novo presidente seria feita, pela primeira vez, através do sistema de um colégio eleitoral, composto, exclusivamente, por figuras afectas ao regime.

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MOÇAMBIQUE - 1973

A meio do ano de 1973, a situação militar em Moçambique era deveras preocupante, só não atingindo a gravidade da existente na Guiné devido à muito maior extensão do território e ao facto de as forças guerrilheiras ainda não disporem do equipamento antiaéreo já à disposição das forças guineenses do PAIGC. A actividade operacional era marcada pela herança do período de comando do general Kaúlza de Arriaga (Julho de 1969-Março de 1970, como comandante das forças do Exército; Março de 1970-Julho de 1973, como comandante-chefe).

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CARTAS DO FIM

A história dos últimos seis anos do Estado Novo, mesmo para quem já era adulto nessa época, não fica completa apenas com a memória desse tempo. Nos dias de hoje, com uma superabundância de informação, até os segredos politicamente mais importantes acabam por aparecer nos diversos tipos de média. Entre 1968 e 1974, a existência da Censura garantia ao governo a ocultação dos meandros da política, tanto em casos de justificada reserva como naqueles com características que hoje consideramos banais. 

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SINGULARIDADES IMPUBLICÁVEIS DO ESTADO NOVO

CARTAS DE MARCELLO CAETANO PARA SALAZAR

Na passagem do 46.º aniversário do 25 de Abril, aqui deixo aos leitores d’A Bigorna, alguns trechos de cartas escritas por Marcello Caetano a Salazar, em diversos períodos do seu prolongado relacionamento. O último Presidente do Conselho do Estado Novo funcionou, muitas vezes, como denunciante de irregularidades perante o criador do regime. Irregularidades que existiam, que não eram poucas, mas que não vinham a público nem muito menos caíam nas malhas da Justiça.
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DA POSSE DE AMÉRICO TOMÁS À REVOLTA DA SÉ (1958-59)

Empossado o novo Presidente da República [almirante Américo Tomás], Salazar aproveita a ocasião para efectuar uma ampla remodelação no governo. Com a manifesta animosidade que o Exército lhe dedica, a saída de Santos Costa torna-se inevitável. 

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PORTUGAL E OS ALIADOS – 1939-1945

A 1 de Setembro de 1939 a Alemanha invade a Polónia, iniciando-se a Segunda Guerra Mundial. A posição de Portugal relativamente ao conflito tomaria a forma da não-beligerância, sem fazer uma declaração formal de neutralidade, deixando ao governo português liberdade para agir de modo diverso se, no futuro, as condições políticas o aconselhassem. Simultaneamente, todavia, Salazar assumia as obrigações da aliança com a Grã-Bretanha, correndo o risco de fazer crer ao seu velho aliado que a neutralidade seria bastante colaborante.
 
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SALAZAR E O INÍCIO DA GUERRA FRIA

A campanha para a reeleição de Carmona dá a Salazar a oportunidade para um extenso depoimento político. É, de facto, a 7 de Janeiro de 1949, durante a conferência da União Nacional que inaugura a campanha eleitoral, que o chefe do Governo revela, pela primeira vez publicamente, preocupações quanto ao futuro das colónias de África.

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2.ª GUERRA MUNDIAL – ENTRE A VITÓRIA FRANQUISTA E A PROVÁVEL VITÓRIA ALIADA

Em Espanha, ao atingir-se o final do Verão de 1938, é já notório que a sorte da guerra se inclina para os nacionalistas de Franco. Ao seu lado, combatem dezenas de milhares de voluntários italianos, alemães e portugueses, enquanto do lado republicano o principal apoio vem da União Soviética e da França. Simultaneamente, estala a crise da Checoslováquia e a Europa encontra-se a um passo da guerra.

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PORTUGAL, O ULTRAMAR E O FUTURO

Recordando Manuel José Homem de Mello

Faleceu no passado dia 18 de Junho o Dr. Manuel José Homem de Mello. Quis o destino que as referências que fiz à sua histórica obra Portugal, o Ultramar e o Futuro, no meu livro As Mágoas do Império, ocasionassem uma aproximação e o nascimento de uma amizade que se foi aprofundando com os anos. Nascido em 1930, tinha, portanto, 32 anos quando se rebelou ideologicamente contra a política ultramarina do Estado Novo. E, se a rebelião, em si, já era, naqueles tempos, motivo de admiração, também merece relevo a circunstância de o autor ser, então, tão surpreendente maduro e presciente nos seus 32 anos de idade.

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ESTADO NOVO

AS DIFICULDADES DO PÓS-GUERRA

Terminada a 2.ª Guerra Mundial, o regime do Estado Novo ficou perante uma situação política internacional claramente adversa. Enquanto a sociedade civil despertava para uma nova e esperançosa realidade e gerava um grande movimento de contestação e luta eleitoral — o Movimento de Unidade Democrática (MUD) —, no interior do regime, incluindo as Forças Armadas, não faltava quem se apercebesse de que, forçosamente, algo haveria de ser mudado.

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O MANDATO PRESIDENCIAL DE CRAVEIRO LOPES 1951-1958

Os anos do mandato presidencial de Craveiro Lopes correspondem a uma nítida separação de águas entre os apoiantes do regime. Como expoente máximo da corrente mais liberal destaca-se o nome de Marcello Caetano. Com o decorrer do tempo, cria-se a ideia de que o próprio Craveiro Lopes alinha com este grupo, o qual preconiza uma progressiva reforma do Estado Novo.

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A MORTE DE CARMONA E AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 1951

A 18 de Abril de 1951, morre o marechal Carmona. Com o seu desaparecimento, abre-se uma das mais marcantes crises do regime. Convocado o Conselho de Ministros para 23 de Abril, Salazar ouve os pareceres dos diversos membros do governo. De acordo com o ritual do regime, as primeiras declarações vão no sentido de Salazar apresentar a sua própria candidatura, hipótese desde logo repelida pelo ditador, que via a figura de um militar na chefia do Estado como a sua principal protecção contra qualquer animosidade das Forças Armadas.

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1934/35 – A UNIÃO NACIONAL E O REGRESSO A QUARTÉIS

            A realização do 1.º Congresso da União Nacional — 26 a 28 de Maio de 1934 — seria um momento propício para Salazar consolidar a sua cruzada de conquista do poder. Nesta tarefa, está sempre presente o desejo de recolocar o Exército na plena subordinação ao poder político civil. 

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ÚLTIMAS SEMANAS DO ESTADO NOVO

Em 5 de Março de 1974, teve lugar, em Cascais, o último grande plenário do MOFA – Movimento dos Oficiais das Forças Armadas, como então se designava o que viria a ser o MFA. Terminada a reunião, muitos participantes haviam ficado com a sensação de que se não conseguira um consenso, tão alargado quanto o desejável, em torno de um programa político que servisse de base a uma revolta militar contra o regime.

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A RECANDIDATURA DE CARMONA ÀS ELEIÇÕES DE 1949

No seguimento das tentativas de rebelião do Exército, contra o Estado Novo, ocorridas em 1946 e 1947, a acção repressiva sobre os militares adversários do regime não fazia desaparecer a sensação de ameaça que o aparelho militar passara a constituir para as hostes salazaristas.

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A CENSURA NO ESTADO NOVO

Pequena crónica de uma vilania bem-sucedida

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1932 – SALAZAR PRESIDENTE DO CONSELHO DE MINISTROS

Ao iniciar-se o ano de 1932, a Ditadura Militar, apesar de não conseguir evitar alguns sobressaltos revolucionários, a caminha agora a ritmo seguro para uma normalização institucional. O prestígio de Salazar não cessa de crescer. Apesar de não ter, ainda, atingido o topo da sua carreira política, as forças civis e militares que suportam o poder julgam ser chegado o momento da «canonização política» do ministro das Finanças —, passo que antecede, naturalmente, a sua inevitável subida a presidente do Ministério.

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AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 1958

1.ª Parte

Enquanto a trajectória política de Craveiro Lopes entra na sua fase descendente, um outro general afecto ao regime, Humberto Delgado, inicia o percurso ascendente que o levará para a dissidência e para a oposição a Salazar. 

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2.ª Parte

A 31 de Maio de 1958, o Secretário-Geral da Presidência da República informa Marcello Caetano de que Craveiro Lopes deseja falar-lhe. Uma vez em Belém, Caetano escuta do Presidente as seguintes palavras:

                        «Pedi-lhe para vir aqui, como colaborador mais próximo do Presidente do Conselho, porque desejava pô-lo ao corrente de factos que se estão a passar e reputo graves. 

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SALAZAR E A CONQUISTA DO PODER

Em 25 de Março de 1928, Carmona é eleito Presidente da República. Depois de formalmente empossado, constitui novo governo presidido pelo general Vicente de Freitas. Para a pasta das Finanças retorna Oliveira Salazar, sendo empossado a 27 de Abril. Mas aceita o cargo sob pesadas condições: direito de veto sobre todas as despesas públicas e controlo total dos orçamentos ministeriais.

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A DITADURA MILITAR E OS ALICERCES DO SALAZARISMO

Teve um arranque difícil o regime saído da revolta de 28 de Maio de 1926. A ausência de qualquer projecto político ou programa de governo seria fonte de intermináveis equívocos e iria propiciar uma inevitável instabilidade no manuseamento do recém-adquirido Poder. 
 
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QUEM PÕE E DISPÕE NOS BASTIDORES SÃO OS HOMENS DE NEGÓCIOS

Carta de Marcelo Caetano a Salazar
25 de Janeiro de 1944

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As pressões norte-americanas para a utilização da base das Lages

durante a Guerra do Yom-Kippur (1973)

            As pressões diplomáticas e as ameaças veladas dos nossos aliados, por causa da utilização das instalações militares dos Açores, nno constituíram um fenómeno isolado no contexto da 2.ª Guerra Mundial. Um outro significativo episódio iria ocorrer, mais próximo dos nossos dias, durante a Guerra do Yom-Kippur (Outubro de 1973).

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SALAZAR E A ECONOMIA

Extractos do discurso proferido em 27/04/1943


Julgo que algumas vezes se têm exagerado as nossas possibilidades. Nós somos um país pobre, que tanto quanto se enxerga no futuro não pode na metrópole aspirar a mais do que à dignidade de uma vida modesta. A ideia de que somos um país rico por causa da doçura do clima e do puríssimo azul do nosso céu é uma ideia feita... e falsa, como a dos incultos do Alentejo e a da imensidão dos baldios. [...]

No acanhado espaço a população em crescimento constante procura viver -- há-de encontrar trabalho e sustento. Não se dá outro fim ao que se tem feito para conhecer de verdade as riquezas do subsolo e a sua melhor utlização, fixar as dunas, repovoar as serras, dividir e aproveitar os baldios, irrigar os campos, regularizar os cursos de água, enxugar, dessalgar e defender as terras. Tudo é apenas alargar as áreas úteis -- propriamente tornar maior o País. Sem suspensão nem desvios há aí trabalho para duas, três décadas ou mais e gasto de muitos milhões, mas os resultados hão-de possivelmente revelar-se em atraso relativamente à população -- tanto em disponibilidades alimentares como em trabalho exigido: grave dificuldade.

Vejo-lhe dois remédios, a aplicar conjuntamente -- a colonização ultramarina, a intensificação do trabalho industrial. As terras coloniais, ricas, extensas, de valor nulo e fraquíssima densidade populacional são o natural complemento da agricultura metropolitana, nos géneros pobres sobretudo, e das matérias primas para a indústria, além de fixadores de uma população em excesso daquilo que a Metrópole ainda comporte e o Brasil não deseje receber. Definida a solidariedade económica e política nalgumas proposições do Acto Colonial, a marcha do tempo tem ido revelando a possibilidade e demonstrando inequivocamente a necessidade de uma política que assente na base imperial a economia da Nação.

SALAZAR, António de O., Discursos e Notas Políticas, Vol. III, pp. 395-397. Sublinhado nosso.

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SALAZAR: Uma autocrítica antecipada

 

            A questão da idade marcou profundamente todo o consulado de Salazar. Por alturas do termo da 2ª Guerra Mundial, Salazar está seriamente abalado — política e fisicamente — após 17 anos ininterruptos de governação.

            Mas repare-se nos exemplos que a seguir apresentamos, ilustrativos do que acabamos de referir. São dois textos políticos, ambos da autoria do ditador, relacionados com o nosso passado glorioso e com a evocação dos nossos «heróis e santos».

            No primeiro, datado de Janeiro de 1933 (Salazar tinha, então, 43 anos), o ditador abordava globalmente a problemática das reformas políticas e as dificuldades a elas sempre ligadas:

            «Um problema grave surge, a fazer soçobrar por vezes estas tentativas reformadoras — a possibilidade ou impossibilidade de adaptação do temperamento nacional a determinada concepção da vida colectiva. Outro problema é afim deste: até que ponto deve ser deixado imutável, deve ser cultivado o conceito generalizado, tradicional da vida da nação, os seus velhos ideais patrióticos, a sua forma de compreender a vida e de actuar no mundo?

            »Por mim atrevo‑me a dizer que estamos demasiadamente presos à memória dos nossos heróis — nunca, aliás, querida e venerada em excesso —, demasiadamente escravizados a um ideal colectivo que gira sempre à roda de glórias passadas e inigualáveis heroísmosO nosso passado heróico pesa de mais no nosso presente.

            »Só nós tivemos Vasco da Gama, João de Castro, Afonso de Albuquerque, os triunfos, as glórias fulgurantes da Índia; por detrás de nós, comerciantes ingleses, incomparavelmente menos ilustres, criaram para a Inglaterra, sem dar por isso, um grande Império. Só nós tivemos D. João I, a «ínclita geração de altos infantes», D. Afonso V, para estender Portugal para além do estreito e conquistar o Norte de África; mas quem domina e vende os seus produtos em Marrocos é a França e a Espanha. Só nós tivemos Pedro Álvares Cabral, as missões dos jesuítas, o Brasil; mas, ainda que essa seja a nossa colónia de portugueses mais numerosa, vão‑se os nossos compatriotas ficando ligados ao comércio e às profissões mais humildes, batidos em muitos estados por alemães e italianos. Só nós ensinámos os caminhos dos grandes oceanos a todos os povos da terra, fomos ao comércio e à pesca primeiro que muitos outros; e compramos agora o bacalhau à Noruega e embarcamos as nossas mercadorias em navios ingleses e da pequena Holanda. A querermos agarrar‑nos às concepções dos tempos heróicos, corremos o risco de aparecermos como braços desocupados num mundo novo que nos não entende[1]

 

            O segundo texto, datado de 1954 — Salazar tem então 65 anos — é uma passagem de um discurso proferido na Assembleia Nacional a propósito da crise de Goa e das ameaças de invasão por parte da União Indiana. Nesta circunstância, volvidos mais de 21 anos sobre o texto anterior, afirmaria o ditador:

            «E se, apesar de tudo, a União Indiana levar a guerra ao pequeno território, o que podem fazer as forças que ali se encontram ou vierem a ser concentradas? Bater-se, lutar, não no limite das possibilidades, mas para além do impossível. Devemos isso a nós próprios, a Goa, à civilização do Ocidente, ao mundo, ainda que este sorria compadecidamente de nós. Depois de afagar as pedras das fortalezas de Diu ou de Damão, orar na igreja do Bom Jesus, abraçar os pés do Apóstolo das Índias, todo o português pode combater até ao último extremo, contra dez ou contra mil, com a consciência de cumprir apenas um dever. Nem o caso seria novo nos anais da Índia.»[2]

            No primeiro texto, nota-se o espírito clarividente de quem, respeitando o passado como memória da Nação, sabe ser necessário corrigir erros ancestrais que conduziram ao apagamento do presente. No segundo, é já o ancião que, tendo perdido a lucidez da juventude, regressa cambaleante às brumas do passado, em busca de soluções heróicas para os problemas do presente.

 

In DAVID MARTELO, A Espada de Dois Gumes - As Forças Armadas do Estado Novo (1926-1974)



[1] SALAZAR, Prefácio a ANTÓNIO FERRO, Salazar, o homem e a sua obra, pp. XXXIX-XLI. Sublinhados nossos.

[2]  SALAZAR, Discursos e Notas Políticas, Vol. V, pp. 277-278. Sublinhado nosso.

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